terça-feira, 25 de maio de 2010

Um velho naquele barco abandonado

O barco remava sem destino e o velho do barco estava lá ainda.

As rugas na sua face mostram o que ele passou, o que ele sofreu e hoje, ainda anda à procura de ventos favoráveis para o levarem de volta aos tempos da adolescência onde ele próprio disse-me um dia, que foram os dias mais felizes da vida dele.

É tenebroso pensar que um dia, todos nós seremos como o velho no barco sem destino, onde andaremos em círculos infinitos à procura de um rumo à nossa vida, e não temos ninguém para agarrarmos e dizermos para dar fôlego à nossa vela.

Hoje o dia acordou novamente triste, e o velho continua a divagar pelas ondas que vão-se agitando cada vez mais, mas ele não quer ainda sair do mar que um dia o encontrou.

Ele lança a sua linha e espera que alguma coisa morda, mas… Nada.

O mar não está favorável para a pesca já à uns longos anos para aquele velho, mas ele não desiste e diz que foi ali que um dia conseguiu apanhar um dos maiores acontecimentos da sua vida… A razão que o fez voltar ao mar um sem vezes de contas e diz que nunca sairá dali até ao dia que conseguir esse momento mais uma última vez.

Eu sentei-me no cais a olhar para o velho, mas nada. Não acontecia sequer um movimento, e eu como não percebi o porquê de ele continuar assim fui-me embora.

Passou mais um dia, mas hoje parece que existe um cheiro especial pelo ar, um cheiro a água salgada que não me largou desde o dia de ontem.

Chego ao cais e o velho do barco já não estava lá. A silhueta do barco já não aparece e eu não entendo o facto de o velho não encontrar-se ali hoje.

Pergunto ao pescador onde estava o velho do barco, ao que ele me responde:

- “Ele finalmente encontrou o que queria, finalmente voltou aos seus tempos onde tudo era belo, mas nós, pescadores de terra, ainda nos encontramos aqui parados, à espera que encontremos também aquele momento.”

Não percebi ao princípio as palavras do pescador, mas só mais tarde consegui entender…

Passaram agora 70 anos desde que eu vi o velho. Nunca mais consegui ver o eclipse das velas a bailarem ao vento, mas hoje, sou eu que conduzo o barco, já não sou pescador de terra, agora ponho rumo às velas e espero que um dia, elas levem-me aos momentos em que eu construí aquele castelo de areia imóvel que parecia indestrutível, até uma onda do mar embarca-lo para um mundo diferente.

Obrigado, velho do barco. Finalmente percebi que a vida afinal não deve ser passada em terra, mas sim no mar, para nós próprios pudermos ser donos do nosso barco e guiámo-lo pelas estrelas coladas ao céu, onde um dia, eu próprio, possa desaparecer para me tornar um só com o mar, como tu um dia também tornaste-te.

Sem comentários:

Enviar um comentário